A Oração Dominical

“E quando orarem, não fiquem sempre repetindo a mesma coisa, como fazem os pagãos. Eles pensam que por muito falarem serão ouvidos.

Não sejam iguais a eles, porque o seu Pai sabe do que vocês precisam, antes mesmo de o pedirem.

Vocês, orem assim: ‘Pai nosso, que estás nos céus! Santificado seja o teu nome.

Venha o teu Reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.

Dá-nos hoje o nosso pão de cada dia.

Perdoa as nossas dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores.

E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino, o poder e a glória para sempre. Amém.

Pois se perdoarem as ofensas uns dos outros, o Pai celestial também lhes perdoará. Mas se não perdoarem uns aos outros, o Pai celestial não lhes perdoará as ofensas" – Mateus 6:7-15.

 

O termo Dominical refere-se ao dia da semana domingo, mas também pode fazer alusão às coisas que dizem respeito a Deus (em latim, Dominus). Muitos de nós já conhecemos essa oração e a chamamos de Pai Nosso. Temos compromissos a cumprir no nosso cotidiano, tarefas no lar, responsabilidades para com os filhos e familiares, entretanto, precisamos colocar em primeiro plano nossa relação com o Criador, afinal, antes de tudo o que existe, Ele é a causa primeira.

O Pai Nosso ou Oração Dominical, como queiram chamar, não se limita a ser uma simples repetição de palavras, na verdade, pode adquirir esse caráter se nós, ao a colocarmos em prática não estivermos com o nosso pensamento voltado para o seu mais profundo significado.

O judaísmo à época de Jesus encontrava-se muito arraigado às suas tradições. Quando o cristianismo primitivo começou a se manifestar, surgiram conflitos como por exemplo em relação à circuncisão. Sabe-se que alguns discípulos como Tiago eram a favor deste procedimento, enquanto Paulo de Tarso já defendia o oposto. Na visão judaica, o conceito de Deus era monoteísta, mas o Deus de Israel era apenas o Deus daquela comunidade.

Jesus ao apresentar a oração Dominical traz junto a presença de um Deus Universal, que pertence a toda a humanidade.

Antes de dizer aos discípulos o conteúdo da oração, Jesus os adverte severamente, Matheus 6:5. Poucos versículos antes, lemos também que Jesus os orienta a praticar a caridade sem alardes, sem que se faça propaganda a respeito.

Dando continuidade à mesma linha de raciocínio, o Mestre estende essa conduta para os momentos em que fomos conversar com Deus.

Orar é diferente de rezar. Geralmente a reza é composta de palavras prontas, decoradas, as quais se repete imaginando que a simples verbalização sonora das palavras irá produzir algum efeito. Sabemos que o Pai Nosso, de certa maneira é algo pronto, contudo, trata-se apenas de um modelo a nos guiar, sendo muito importante sempre meditar sobre cada palavra dita.

Não devemos nos comportar como os hipócritas, relembra Jesus, são pessoas que fazem questão de mostrar publicamente suas obras religiosas. Não se preocupam em se conectar com o Divino, em Verdade e em Espírito, antes, possuem como objetivo se fazerem vistos pelas massas e, então receber seus reconhecimentos.

Nos tempos atuais, após mais de 2000 anos de história, ainda testemunhamos os mesmos fariseus de antigamente, hoje se vestem com outras roupagens religiosas, mas continuam orando nas igrejas, nas televisões, nas redes sociais, promovendo falsos milagres a fim de obter não a redenção espiritual do povo, mas o máximo de numerário possível.

Jesus então inicia o Pai Nosso, com a expressão: “Pai Nosso que estás no Céu”. Sem querer discutir sobre a paternidade de Deus, que exclui o sagrado feminino de sua natureza, pois sendo gerador da vida, não poderia Deus ser mãe também? Sabe-se que Jesus era semita e proveniente de uma tradição escrita do Antigo Testamento com diversas passagens que já se referiam a Deus na figura paterna como, por exemplo em Salmos 89:27, Eclesiástico 23:1 e Eclesiástico 51:10.

Ele está nos Céus, pois representa o trono Deus, a posição absoluta do Criador, que tudo vê e tudo pode controlar. Podemos é claro, na visão mais apurada da Doutrina Espírita compreender os Céus, como moradas superiores, não locais circunscritos, mas estados de evolução de nossa consciência. Portanto, Deus habita nos Céus, Ele possui em si mesmo essa razão absoluta.

O termo “santificado” para se referir ao Seu nome, possui o sentido mais preciso do reconhecimento. O homem deve saber quem é Deus antes de tudo, e ao fazer esse movimento, Ele se revela ao homem como Santo por Natureza, contudo, cabe ao homem santificar as coisas de Deus pela obediência de Seus Mandamentos.

Em seguida a oração fala sobre o Reino de Deus que deve vir até nós. Em outras traduções, provenientes diretamente do Aramaico, lê-se, “vamos nós ao teu Reino”. De qualquer maneira, o Reino de Deus já fora citado também em outras passagens do Antigo Testamento e se refere ao exercício do poder de Deus sobre toda a Criação. O homem não se encontra abandonado, não só o judeu, mas todos os seres humanos. Deus onipotente, observa tudo, mas cabe ao homem promover o esforço para alcançar o seu conhecimento. De certa maneira, o Reino já se manifestara no mundo pela figura de Jesus, o Cristo, cabe agora o homem fazer o seu papel para que esse Reino se estenda até nós.

A frase seguinte praticamente sintetiza os dois pedidos feitos anteriormente. Nesse ponto, o homem já reconheceu sua condição de criatura, impotente diante de toda a realidade que o criou. Ele se comunica com Deus reconhecendo toda a sua superioridade e o caráter justo e inexorável de sua Vontade. Tudo o que Deus deseja deve por natureza ser perfeito e bom, assim o homem deixa de lado suas aspirações incompletas para reconhecer o cumprimento da vontade Divina, “Seja feita a Sua Vontade, assim na Terra como no Céu”.

Quando solicitamos ao Criador o pão nosso de cada dia, na verdade, nos damos conta de que Ele, em última instância, é quem nos prove o alimento. Não somente o alimento material, mas também o Espiritual, pois como disse o próprio Jesus em outra passagem: “Nem só de pão vive o homem, mas das palavras que provém de Deus”. O Senhor com certeza nos alimenta a cada dia. Mesmo passando a fome orgânica, a experiencia na vida física já é o maior alimento, pois o Espírito vive e aprende, erra e corrige, adquire gradualmente mais saber e cresce, ora intelectualmente, ora moralmente; esse processo nada mais é do que caminhar em direção ao mesmo Reino, que já fora citado anteriormente.

Em seguida, a oração deixa de focar seus pedidos nas nossas necessidades simples e necessárias e promove um movimento contrário em busca de uma reforma íntima, imprescindível para que nossa proximidade com Deus seja real, trata-se do perdão. Ao solicitarmos ao Senhor que perdoe nossos delitos e, sedentos de que Ele atenda aos nossos pedidos, precisaremos antes perdoar aqueles que nos ofenderam. É uma condicional para aprendermos a lição do Mestre. Deus nos atende amorosamente sempre, Ele quer que sejamos pessoas virtuosas, mas precisamos fazer a nossa parte. Perdoar não é fácil, portanto, esse exercício durante a oração nos convida a uma reflexão interior, ao invés de tentarmos mudar o mundo, começamos transformando a nós mesmos.

Por fim, Jesus nos fala das tentações. Ele mesmo fora tentado por 40 dias e 40 noites enquanto esteve no deserto e, venceu. Seu exemplo deve ser imitado por todos nós, podemos com certeza vencer todas as nossas imperfeições, contudo, quando estamos ligados à Deus pelo pensamento puro e pela vida reta, temos mais condições para vencer tudo de negativo que existe dentro nós. A presença do Senhor promove nossa iluminação e certezas imediatas da melhor posição a ser tomada, da escolha mais racional e justa possível, certamente um diálogo da fé com a razão. O homem quer ver-se livre do mal, sabe que o mal lhe afasta de uma vida feliz e da presença de Deus. De fato, Ele sempre está conosco, devemos então nos perguntar se ao nos envolvermos pelos caminhos tortuosos ainda estamos caminhando com Deus em nossos corações.

A Oração Dominical tem um valor absoluto, ela sintetiza da melhor maneira o modo de nos dirigirmos a Deus, jamais pedindo realizações pessoais ou bens materiais. Podemos exercitá-la diariamente, como ensinou Jesus; no silêncio de nossos aposentos, para que ninguém mais veja, mas somente Deus que habita no interior no nosso Ser, único capaz de ouvi-la a atender às nossas súplicas.